UM PAPO DE CINEMA

Com HSU CHIEN HSIN

QUEM É HSU CHIEN HSIN?


Nascido em Taiwan, em 1967, vive no Brasil, no Rio de Janeiro, desde 1970. Se formou em Cinema pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Começou como Assistente de Direção em 1996 e, desde então, trabalhou em mais de 70 longa-metragens como Assistente de Cineastas de sucesso, entre eles: Daniel Filho, Tizuka Yamasaki, Murilo Salles, Rosane Svarztman e Roberto Santucci.

Hsu Chien dirigiu mais de 8 curtas-metragens, recebendo mais de 20 prêmios em Festivais brasileiros e internacionais. Entre os prêmios, destaque para Melhor curta de ficção em 2015 por “Flerte”, no Grande Prêmio da Academia de cinema brasileiro, e melhor curta no Labrf 2015. “Meu preço”, de 2018, realizado com Fabricio Santiago e Felipe Cabral, recebeu 8 prêmios internacionais. 

Em 2014, foi convidado para dirigir uma série no Multishow, “Por isso eu sou Vingativa”. No mesmo ano, foi convidado por Miguel Falabella e a diretora geral Cininha de Paula para dirigir na Rede Globo, dois seriados: ‘Sexo e as negas” e “Pé na cova”.

Em 2017 dirigiu seu primeiro longa-metragem: “Ninguém entra ninguém sai”, baseado em conto de Luis Fernando Veríssimo e distribuído pela Imagem Filmes. 

Em 2019 dirigiu seu segundo longa-metragem, “Quem vai ficar com Mario?”, com distribuição da Paris Filmes e Warner, com lançamento previsto para 2020.

Em 2020, dirigiu seu terceiro longa, “Me tira da mira”, produção da Imagem Filmes. 

Atualmente está desenvolvendo seu próximo longa, “Combinado não sai caro”, pela Imagem Filmes. 

Hsu também é professor, e faz parte do corpo de professores da ABC Cursos de Cinema. 

Em 2018, fez parte da comissão do Oscar para escolha do filme brasileiro que representaria o Brasil no evento. 

 

A ENTREVISTA


Oi, Hsu Chien é uma alegria imensa ter você como nosso homenageado, da terceira edição do CINECAR, e sem dúvida, uma satisfação ainda maior, por nos conceder essa entrevista. Vamos lá?

 

FESTIVAL DE CINEMA

— Você sempre enfatiza a importância de conhecer os clássicos do cinema, e lamenta encontrar estudantes e profissionais que, não possuem uma cultura cinematográfica. Você acha que além da formação técnica, todo bom profissional do cinema e do audiovisual precisa necessariamente, tornar-se cinéfilo? Ou não, uma pessoa pode ser um excelente profissional, sem sequer ter visto meia dúzia de obras?

HSU CHIEN HSIN  

Eu, quando estou trabalhando em uma produção, seja dirigindo ou trabalhando como diretor assistente, eu fico muito triste, quando troco informações sobre o projeto em relação ao conceito técnico, artístico, sob referências. Ah! este filme tem uma pegada neorrealista italiana, tem uma pegada expressionista alemã tem uma vibração meio Fellini, meio Pasolini. E você fica olhando na cara do profissional, seja fotógrafo, diretor de arte e até os estagiários, todo mundo fica assim, caramba! O que é que este cara tá falando? E ai, eu fico triste, porque cinema é essa comunhão de conhecimentos né? Culturais, não só de cinema, como também história da arte, fotografia, história da moda, cultura geral, tudo isso faz parte de nosso universo, nós trabalhamos com cultura. Eu particularmente, fico triste. Se o profissional vai ser melhor ou não, sendo cinéfilo ou não, isso eu não sei dizer, porque é muito particular de cada profissional.

— Tem pessoas que tiveram grande dom e grande sorte de nascerem com talento para a parte técnica, independente se terem visto os filmes ou não. Outros não, outros precisam assistir filmes para poder ter alguma referência. O que eu digo pra mim é o seguinte: estudantes de cinema, profissionais de cinemas que queiram trabalhar no mercado, eu não vejo sentido trabalhar no audiovisual, se não for pela paixão em ver filmes e até alguns seriados. Isso faz parte do nosso universo. Isso é o que nos alimenta, não necessariamente precisa ser um cinéfilo, porque, pra ser cinéfilo não é pra qualquer um, eu assisto cinco filmes por dia, não é todo mundo que tem essa vibração; mais pelo menos ser apaixonado por cinema. Uma coisa é ser apaixonado por cinema, outra coisa é ser cinéfilo. Então se a pessoa for apaixonada por cinema e assistir a filmes clássicos, não só os clássicos, filmes importantes também do cinema contemporâneo, que fazem a diferença e que até hoje estão aí perdurando e que trazem referências pra gente, acho isso sim, fundamental para a pessoa se tornar um profissional melhor no presente e no futuro, caso ele seja um estudante.

 

FESTIVAL DE CINEMA

— Ainda sobre os clássicos, você comenta que se deparou com uma turma de interpretação desconhecedora da obra do Ingmar Bergman, Sergio Rizzo (Jornalista, professor em pós-graduação, crítico e curador de Cinema) descreve que parte da Suécia, lugar de origem do autor, existe uma resistência, pois acreditam que seus filmes não correspondem ao que eles imaginam ter sido efetivamente a sociedade sueca. E que muitas feministas na Suécia consideram sua obra maldita, por não corresponder ao entendimento que se tem na atualidade sobre o papel da mulher. O fato de você se deparar com uma turma de intepretação alheia ao Bergman, não seria esse um reflexo deste pensamento feminista que vai se disseminado mundo a fora, levando professores, palestrantes e batedores na área de formação, que são atuantes no campo ativista, a evitarem de apresentar ou se aprofundar não somente na obra do Bergman, mas também em outros autores clássicos que suponham estarem obsoletos? E se isso for um fato, que tipo de prejuízo pode ocasionar na formação de futuros profissionais do cinema e do audiovisual?

HSU CHIEN HSIN  

— O que a acontece? Eu dei uma palestra a uma turma de interpretação e falei sobre Persona do Bergman, e todo mundo fez uma cara, tipo assim, ninguém sabia do filme e muito menos do cineasta. E eu fiquei, de certa forma, chocado, porque, de uma forma geral, as escolas de interpretação aqui no Brasil, visam muito o palco do teatro. Alguns ainda fazem uma cadeira livre de interpretação da tv, mas na parte de conhecimentos gerais, muito poucas escolas fazem tipo uma cinemateca, apresentando filmes importantes para os atores e futuros atores e discutir um pouco o trabalho daquele diretor e o trabalho dele em relação à direção de atores.

— No caso do Bergman, a questão não é sobre a temática feminista, ou se o povo da Suécia é contra os filmes dele, por ser isso ou aquilo, não é isso, a pauta não foi essa. A pauta é, ninguém conhecia o trabalho do Bergman, ou fazia ideia de quem era essa pessoa, e não se negaram a ver o trabalho dele por outras questões. Não foi isso. O que eu estou falando em relação à proatividade, e o que eu chamo de proatividade, que eu reclamo pros alunos e profissionais, as pessoas não se motivam a querer estudar mais temas e assuntos importantes para sua área de atuação. Por exemplo, se o cara quer ser ator, ele tem que ver filmes importantes que traga trabalhos importantes na área de atuação, Bergman é isso.

— Bergman todos os trabalhos dele, você tem um trabalho forte de atuação, assim como outros diretores também. Enfim este é o meu questionamento: é a falta de interesse dos profissionais, até por falta, não sei se é falta de motivação, ou porque algum professor, monitor, tutor ou quem quer que seja não motivou estas pessoas a estudarem mais e a buscar outras coisas, e não aquilo que a escola oferece, a questão é essa. É… Se vai trazer prejuízo para este futuro profissional, seja na frente ou por trás das câmeras, de novo, o prejuízo é mais cultural. Eu não consigo entender uma pessoa querendo trabalhar na área da cultura não querer se embasar em conhecimentos gerais, não só em filme, como peça de teatro.

— Tem que ir ao teatro, e a maioria das pessoas do audiovisual não vão ao teatro, tem gente que se recusa em ir ao teatro, acha chato. Eu acho uma pena. Tem que ir ao teatro, conhecer gente nova, tem que ler, tem que buscar conhecimento na área da fotografia, história da moda, história da pintura, tudo faz parte do nosso conhecimento. Então, tudo isso é o que nos alimenta, e nos mantém vivos, então se a pessoa vai ser um profissional melhor ou não, é de cada um. Mas no meu ponto de vista, essa pessoa vai ter mais habilidade, mais fomento, mais condições de conversar com outro profissional, conversar com o diretor, com o preparador de elenco, com fotógrafo, quando ele tem mais base cultural.

 

Emiliano Dávila, Letícia-Lima e Hsu Chien Hsin – créditos Gui Maia

 

FESTIVAL DE CINEMA

—Você trabalhou no projeto com Miguel Falabella, no filme Veneza. O que essa obra se propõe a dizer à sociedade?

HSU CHIEN HSIN  

— O filme Veneza, de Miguel Falabella, ele é uma adaptação de uma peça de um escritor argentino. Foi encenado no teatro da Argentina, e pelo Miguel, aqui no Brasil. O Miguel pegou a obra original, e fez um olhar diferenciado dentro do universo do Falabella. Falabella, tem um universo que lida muito com a questão da poesia, do lúdico, de como a gente busca o lúdico para enfrentar essa realidade tão sofrida em termos de violência, assédio moral, sexual e todos outros tipos de pena que maltratam a sociedade, o ser humano.

— Então, esse filme Veneza é sobre isso. É, como nós nos atemos à poesia, ao mágico, ao sonho, para poder sairmos de uma realidade tão crua, tão dura. Então, o filme é importante sim, por que não estamos vivendo momentos fáceis, estamos em uma realidade muito triste, estamos aí, vivendo toda essas questões da pandemia, desemprego crise social política no governo, desgoverno, enfim! Então, Veneza é importante para a gente entender que sim, é importante sonhar, mas não sonhar: ah! Eu gostaria, sonhar e ir à luta pra buscar seus sonhos.

— Que só sonhar também não adianta, sonhar o sonho como uma forma de escape, mas o sonho como uma forma de ir buscar essa realidade, não pode ser somente um sonho. O sonho tem que se tornar real. Então, essa é a importância do filme.

 

FESTIVAL DE CINEMA

— O movimento das mulheres no Brasil, entre outras questões, cobra mais espaço no mercado do cinema e do audiovisual, por acreditar ser um ambiente ainda muito machista, engessando a possível participação delas. Você identifica essas dificuldades das mulheres estarem à frente de projetos importantes por consequência de o mercado ainda ser um ambiente machista? Caso sua percepção lhe traga a convicção de que tal fato não corresponde com a realidade, como você definiria o mercado de cinema, em termos de oportunidade para as mulheres? Porém, se sua percepção é de que tal fato é uma realidade, vai a pergunta seguinte: como profissional da área, ou até mesmo quando está à frente de um projeto, você elabora iniciativas na intenção de agregar a luta destas mulheres?

HSU CHIEN HSIN  

— Eu trabalho no cinema, desde 96. Estamos em 2021 concordo totalmente com essa questão, que quando eu comecei a trabalhar em noventa e seis, esse papel das mulheres dentro das equipes de cinema era muito restrito àquelas áreas meias chavões tipo: figurino, maquiagem, continuísta, etc e tal. Graças a Deus, de lá pra cá, principalmente nos últimos anos, isso se transformou. As mulheres estão com um… perfil muito forte em áreas criativas na área da direção, na área da fotografia, pessoalmente, na área da produção, na área de assistente de direção.

— Então, tem muitas áreas antes dominadas pelos homens, e hoje em dia as mulheres estão aí, competindo de igual para igual, etc e tal. Então, eu fico muito feliz, em saber que isso está acontecendo e que existe uma preocupação sim, porque vários projetos que eu tenho trabalhado, essa é uma questão de equalizar a… condição gênero, né? A gente tem que equilibrar homens, mulheres, LGBT, negros, questões raciais. Então graças a Deus, as pessoas estão muito focadas hoje em dia nesta questão de equalizar gêneros e raças. É… sei que é difícil ainda na questão festivais de cinema, é uma reclamação geral de que, normalmente, os filmes premiados as diretoras indicadas são poucas. Ainda está no universo machistas em relação a festivais.

— Espero que os festivais de cinema tenham esse olhar, para tentar também equalizar em relação a gêneros e raças, na competição, como tá fazendo o Oscar agora.  Entre os indicados, tem que haver um equilíbrio na indicação é isso. É muito importante pra gente. Eu mesmo, quando trabalho nos meus projetos, faço questão de fazer esse equilíbrio gênero e raça, que é muito importante pra gente. 

 

FESTIVAL DE CINEMA

— A televisão brasileira contou a história da chegada dos italianos em terras brasileiras. Como chinês seria incrível contar a história da imigração chinesa no Brasil. Mas enquanto aguardamos a possibilidade de um projeto dessa envergadura, nos fala sobre, em que circunstância aconteceu a chegada de sua família aqui no Brasil?

HSU CHIEN HSIN  

— Em relação à imigração chinesa no Brasil, e como a gente vê isso no audiovisual, eu mesmo, anos atrás, escrevi um pouco a história minha, do meu pai da vinda ao Brasil, mas eu sei que é difícil são histórias caras, que quando você faz um filme de época, já se torna inviável ainda mais nos dias de hoje, que os orçamentos são apertados.

— E também eu fico me perguntando: que eu trabalhei no filme da Tizuka, “Gaijin 2” que fala sobre imigração Japonesa no Brasil, e o Brasil é um dos países com maior quantidade com população de Japonesa no mundo. E o filme “Gaijin”, quando foi lançado, quase ninguém viu, foi muito triste que a própria comunidade Japonesa não tem interesse em saber de sua história. Então, assim, isso é um balde de água fria.

— Vou escrever um filme de imigração chinesa e qual o interesse nisso para minha cultura e para minha comunidade de chinesa e muito mais para a comunidade brasileira né? Fico pensando um pouco sobre isso, o quão é importante é para essas pessoas? Talvez não em termos de ficção, mas talvez um documentário seja mais interessante. Mas vamos ver, que agora mesmo nos Estados Unidos, um filme chamado “Minári”, que foi escrito por um cineasta sul coreano, com atores sul coreanos, falando sobre imigração sul coreana nos Estados Unidos, fez um super sucesso, super premiado.

— Então, vamos ver. De repente os olhares, hoje em dia, estão diferenciados em relação a isso. E a minha família veio ao Brasil, no início dos anos setenta, muito motivada pela campanha do governo brasileiro na época, né? Governo da ditadura, que incentivava a vinda de estrangeiros. Eles tinham uma campanha chamada: Milagre Econômico, que incentiva a vinda de estrangeiro e de dinheiro estrangeiro para o Brasil. Então, a gente veio neste período. 

 

FESTIVAL DE CINEMA

— O cinema estrangeiro exibido nas emissoras abertas, durante décadas, acabou influenciando o povão a ter preferência por determinados gêneros com determinados formatos. Quando produzimos a primeira edição do CINECAR, vivenciamos isso aqui em Carpina, tanto que em nossa segunda edição, a curadoria também teve característica neste sentido, como parte das estratégias para articulação de público. Essa percepção faz as distribuidoras se interessarem por obras consideradas de mais apelo popular, e produtores envolvidos em projetos que têm a finalidade de seguir trajetória nas principais sala de cinema do país, precisam garantir que desde o cerne da obra, contenha a imagem e semelhança do grande público. No entanto, para outros gêneros e formatos, ainda não temos um mercado bem aquecido. Com todo avanço do audiovisual brasileiro, permitindo que hoje em dia, a TV brasileira tenha mais recursos para produção interna, você observa um movimento de interesse em popularizar tais gêneros? Ou não, por ser a tv um ambiente ligado à audiência, e ao mercado publicitário, a tendência é sempre apostar em projetos que atendam aos diversos interesses?

HSU CHIEN HSIN  

— Não ficou muito claro pra mim, a pergunta, mas vou tentar responder o que eu entendi aqui. É… essa questão do cinema popular, e do cinema de arte, ela não é uma questão não só Brasil, como do mundo inteiro. Eu, como cinéfilo, absolvo muita produção independente americana e também cinema comercial americano. Cinema independente e comercial europeu, asiático, da américa-Latina, enfim, isso porque eu sou cinéfilo.

— E eu, como cinéfilo, entendo que eu preciso às vezes, assistir as vezes preciso assistir a um filme de entretenimento, que é esse gênero popular, e às vezes, eu quero pegar um filme com maior reflexão, um filme que tenha uma outra vibração, mais autoral, para poder ter um outro tipo de reflexão sobre o mundo em que vivemos. Aqui no Brasil, a mesma coisa, nós temos a indústria do cinema do entretimento, que é isso que você falou, que a televisão apresentando esses filmes ajudou o povão a ficar a ficar mais atento a esse gênero e isso os produtores brasileiros é… aproveitaram esse gancho, para produzir filmes mais populares: comédia, ação, policial, etc.

— E a questão do cinema autoral no Brasil, eu tenho muitos amigos que fazem parte da área intelectual trabalham… escritores, roteiristas, diretores, pessoas com alta capacidade intelectual e elas mesmo não gostam de assistir o cinema autoral, alguns gostam de assistir o cinema autoral, outros não gostam de assistir o cinema brasileiro de entretenimento, não só brasileiro, mas estrangeiro. Então, isso é muito do gosto de cada um, independente da sua classe social, classe econômica. Eu tenho amigos também que moram em comunidades, que adoram assistir filme autoral.

— Então, eu não vejo isso muito como uma forma generalizada eu vejo isso como gosto pessoal. Cada um é cada um. Eu gosto de assistir tudo cinema autoral e entretenimento, mas eu tenho amigos que odeiam o cinema brasileiro. Pra se ter uma ideia, que não assiste de jeito nenhum. Tem outros amigos que não gostam de filmes autoral, tem outros que não gostam de cinema de entretenimento. Penso que a indústria de cinema é isso a gente tem que atender a toda necessidade. Retrabalhado para atender ao gosto popular, porque não é isso, filme popular é uma coisa, filme autoral é outra.

— Esse filme autoral tem que atender à necessidade do público que busca autoralidade: esse filme autoral não tem que atender a necessidade de um grande público, claro que o realizador que fez o cinema autoral adoraria que tivesse uma maior gama de público para assistir. Mas a gente tem que entender que o público, às vezes, não gosta de um cinema de um ritmo mais lento, de ficar refletindo muito, etc e tal. A gente tem que entender que existe essa necessidade, não só aqui no Brasil, como no mundo inteiro. São pensamentos e gostos distintos. 

 

Hsu Chien Hsin – créditos Gui Maia

 

FESTIVAL DE CINEMA

— A arte brasileira já vivenciou um período de censura, onde o Estado brasileiro era o grande censurador. Depois de décadas de democracia, os artistas se deparam novamente com o ambiente da censura, desta vez imposta pela sociedade através de seus grupos de representatividades. Outro dia, em entrevista, você relatou que uma das personagens do filme: Ninguém Entra Ninguém Sai, o qual você dirigiu, seria uma evangélica, mas que resolveu fazer uma adaptação, acredito que por receio das igrejas, e representantes da comunidade cristã, não acusarem a obra de profanar a fé. Inclusive, um outro trabalho que você dirigiu, a   série “O Sexo e As Negras”, foi acusada de ser racista. Qual a sua observação? Você acha que esse conceito do “politicamente correto” dá legitimidade à sociedade para ditar regras na produção artística brasileira?

HSU CHIEN HSIN  

— Sobre o politicamente correto, sim. É uma realidade que nós vivemos. Nós, que trabalhamos a área cultural, que vivenciamos muito a questão de produzir conteúdo, hoje em dia… de uns anos pra cá, a gente tá muito ligado não só às questões de censura não tá, tem a questão da censura do governo, do desgoverno que a gente sabe que é relacionada a questões da pauta do LGBT, do negro, etc e tal.

— Das pautas feministas, mas também os próprios movimentos negros, LGBT, feminista, também estão cobrando muito de quem produz conteúdo, a ter um olhar mais realista, mais no lugar da fala menos clichê, menos estereotipados, menos a visão antiga sobre como se retrata um homossexual, como se retrata um negro, na sociedade de hoje, como se retrata uma mulher nos dias de hoje, na sua independência pela sua luta, pela independência, pelos direitos de igualdade de trabalho, igualdade salarial etc e tal.

— Então, tudo isso a gente fica muito atento, quando a gente ler o roteiro, a gente fica assim, isso aqui pode agredir a esse grupo, isso pode ser ruim para esse grupo, isso não sei o que… Porque o que nós queremos, de forma alguma, é agredir a qualquer parcela da sociedade, isso é muito importante ficarmos atentos a isso. Então, tem a questão da censura por um lado, e tem a questão de não agredir parcela de sociedade do outro lado, porque sabemos… principalmente na área da comédia, que muita coisa que era dita até uns cinco, seis anos atrás, hoje em dia é impossível, a gente não pode mais.

— A comédia vivia muito sobre os estereótipos: dos gêneros, da raça, dos físicos. Hoje em dia, já não é mais possível isso, não se pode rir mais disto. Então, trabalhar com comédia, especificamente, virou um grande desafio pra todo mundo: pra roteirista, diretor para o próprio ator, a gente tem que ficar, de certa forma, se vigiando porque de novo, eu pelo menos como diretor, eu de forma alguma, quero agredir, quero humilhar, quero constranger qualquer tipo de ser humano nas suas condições de raça, sexo, gênero, etnia, etc e tal.

— Eu, de certa forma, não gosto. Na verdade, eu nunca gostei, mas hoje em dia muito menos eu não quero, não gosto… Podemos atingir o humor, o drama de outras formas que não agredindo as pessoas. Eu mesmo, como oriental, passei a vida toda, sendo agredido, sofrendo bully por ser oriental etc e tal. Eu não gostaria hoje em dia, de ouvir coisas que eu ouvia anos atrás, pelo fato de ser oriental, então temos que mudar realmente esse pensamento. O que é diferente de certa forma da censura. São dois pensamentos diferente.

 

FESTIVAL DE CINEMA

Depois de 18 anos trabalhando como assistente de direção com trânsito nas principais empresas e profissionais do mercado do cinema e do audiovisual brasileiro, você teve que fazer um movimento idêntico a milhares de aspirantes de início de carreira, que foi criar e bancar seu próprio projeto de curta-metragem, trabalhando com equipe e elenco na brodagem para, em seguida, o filme percorrer em festivais e alçar a um novo patamar na carreira como diretor. Toda sua experiência e expertise de anos como assistente de direção, não poderia ter proporcionado um caminho diferenciado? Em outros segmentos do mercado por exemplo empresas concedem oportunidades para que seus colaboradores desempenhem funções superiores baseadas em suas experiências anteriores de trabalho. No mercado de cinema brasileiro, esse tipo oportunidade não acontece?

HSU CHIEN HSIN  

— Essa pergunta que vocês fizeram é muito encima do meu trabalho, e eu trabalhei mais de 15 anos como assistente de direção, nunca tive oportunidade de dirigir. Obviamente que nenhum produtor vai me chamar para dirigir, sem ter visto algum trabalho meu de direção. E eu mesmo não confiaria em uma pessoa que eu nunca vi fazendo aquela função e chamar ela para fazer aquela função.

— Então, eu entendendo esse processo. Eu resolvi bancar meus curtas, para poder mostrar aos produtores o meu trabalho, como eu dirijo, o resultado, etc e tal. Isso me parece um caminho natural, de alguém chamar alguém para trabalhar, tem que ver, avaliar o trabalho daquela pessoa naquela função. Claro que existe exceções. Tem pessoas que foram chamadas, eram assistentes de direção, foram chamadas para dirigir porque tinham conhecimentos com diretor.

— Era um diretor que, de certa forma, era amigo dele, ou que confiava no trabalho dele, porque trabalhava com ele a muito tempo, etc e tal. Eu não tive essa situação. Então, para eu poder ser visto como diretor eu tive que produzir os meus filmes, obviamente que produzir filmes e dirigir filmes não é fazer qualquer filme, você tem que fazer o filme que tenha a sua identidade, que tenha seu olhar, que seja obviamente…. que tenha obviamente, um excelente resultado em todos os níveis técnico, direção de atores, etc e tal.

— Roteiro para poder chamar a atenção das pessoas, eu penso desta forma. É… eu sempre falo isso para meus alunos, que eu dou aula, de que a gente tem que ser proativo, temos que produzir nossos projetos, não ficar esperando nada acontecer. Se esperar acontecer, nada acontece. Então de certa forma quando a gente produz nossos projetos e faz com excelentes resultados, certamente, isso vai chamar a tenção de alguém, de algum profissional da área para seu trabalho. 

 

FESTIVAL DE CINEMA

Se tivesse que escolher entre a liberdade do cinema e a prosperidade da TV o que decidiria? E por quê?

HSU CHIEN HSIN  

— O que eu diria… eu quero as duas coisas. Eu quero a liberdade do cinema e eu quero a prosperidade da tv, eu sou um profissional do audiovisual, eu não sou o profissional do cinema. Eu sou o profissional do audiovisual, trabalho em toda as áreas do cinema, TV aberta, TV fechada, canal de streaming, o que tiver, eu tô fazendo sou freelance como eu falo pra todo mundo freelance é: abraçamos qualquer coisa. Obviamente coisas projetos que a gente se identifique que a gente goste, que a gente entenda que possa fazer uma diferença, então trabalhar com cinema e com televisão é o meu foco eu equilíbrio com um e outro afinal de contas eu sou freelance eu não sou contratado fixo por uma produtora de cinema, um canal de televisão eu passei em toda as áreas eu gosto desta variedade.

 

FESTIVAL DE CINEMA

— Hsu, fala pra gente o que seu curso pode proporcionar a quem busca conhecimento no mercado do cinema e audiovisual?

HSU CHIEN HSIN  

— E em relação ao meu curso, eu dou curso de assistente de direção. Atualmente estou dando de direção também pela ABC cursos de cinema. O meu curso de assistente de direção ele é… muito como é que eu digo… Ele é muito completo pra quem quiser atingir a função da assistência de direção, eu ensino toda as teorias, todos os recursos, todos os macetes, todos os programas que assistente de direção tem que aprender, tem que saber usar, para poder trabalhar no mercado, e… quando eu vejo naquele aluno alguém com um futuro, alguém que eu identifico que eu diga assim: pô essa pessoa vai dar um ótimo profissional, eu indico essa pessoa para os produtores. Toda hora, eu estou indicando.

— O Affonso Beato é um produtor e fotógrafo, muito conhecido. Ele sempre fala: o Hsu é o maior fornecedor de alunos e profissionais do mercado de trabalho, é uma brincadeira. Mas é verdade eu já indiquei muita gente para trabalhar. Posso dizer com muito orgulho, que centenas de profissionais que eu dei aulas, que hoje em dia, estão trabalhando no mercado. Isso é um orgulho muito grande da minha parte e… porque todo o foco que eu tive na minha vida, de ser motivador proativo, de batalhar, de ir atrás, de estudar, de ver filmes e não sei o quê… toda essa paixão pelo audiovisual, eu passo para meus alunos, ou eu tento passar para meus alunos e faço eles entenderem, que para trabalhar no audiovisual, nós temos que amar essa área, amar, ver filmes, e… abraçar tudo e ser motivador, fazer a diferença e ter o diferencial.

— Porque ser mais um no mercado, não interessa a ninguém você tem que ser o diferencial no mercado então, esses são os pontos que eu dou no meu curso que meu curso não é só sobre audiovisual é também como você se administrar para a sua vida pessoal profissional. Beleza gente obrigado por tudo por tudo e sucesso aí no cine festival carpina. Sucesso gente.